AS RAZÕES DE SER DEÍSTA E O LUGAR DE DEUS NESSE CONTEXTO

 Joaz L. A.

INTRODUÇÃO

O deísmo defende, através da razão, da experimentação e não por doutrina religiosa, que o universo foi criado por uma inteligência superior. Este Ser Superior criou as leis naturais e físicas para reger toda a criação, e não é intervencionista, como sugerem as religiões teístas. Seria como um “deus relojoeiro” iniciando o processo cósmico, o universo segue adiante sem necessitar da supervisão divina. Os fenômenos e acontecimentos ocorrem por causa das leis naturais que ele criou para reger o cosmo.

O deísmo aceita os livros “sagrados” apenas como registro histórico, as vezes até como fonte de inspiração moral e ética, quando não são usadas para justificar o fanatismo, a intolerância, o preconceito e a imposição, mas não como fonte de autoridade ou revelação divina. Deístas não acreditam que Deus se ocupe de nossas necessidades e desejos individuais, e isso não contradiz sua onisciência. Da mesma forma, o dedão do pé é composto de trilhões de células que sabemos que estão lá, cumprindo sua função, porém, desconhecemos a natureza singular de cada uma.

Vamos fazer a confrontação de alguns relatos históricos importantes da bíblia com as evidências já obtidas. Pesquisadores da East Carolina University descobriram evidências (publicado na revista nature em 2021) de uma cidade da Idade do Bronze no vale do Jordão, datada em torno de 1.650 BCE, chamada Tall el-Hammam, que acreditam ser Sodoma relatada na bíblia. Uma relativa concentração de ferro (metal presente nos meteoros) em uma pequena área e as evidências arqueológicas encontradas, tais como, madeiras e tijolos queimados, camadas de carbono e cinzas, minerais derretidos, indicam que tal cidade foi destruída repentinamente por um bólido – meteoro que explode na atmosfera –, evento comparável ao ocorrido em 1908 sobre Tunguska, na Rússia. Um fenômeno que causa destruição semelhante à de uma bomba atômica.

Outro grande relato é sobre a hipótese do dilúvio. Em 2011 pesquisadores descobriram no leito do Mar Negro, vigas de madeira típicos de construções dos assentamentos humanos do leste europeu da época neolítica, ossadas, objetos domésticos, datados em torno de 9.000 BCE. Tais evidências corroboram com a tese de que, com o fim do Último Período Glacial, o consequente aumento do nível do mar Mediterrâneo levou ao colapso das barreiras de rochas do estreito de Bósforo, inundando todo o vale, transformando um lago de água doce em um grande mar de água salgada, causando grande destruição para os povos indo-europeus que habitavam a região.

Portanto, na bíblia há registros de relatos históricos verídicos que ocorreram como consequência de fenômenos naturais, não por causa de castigo divino ou algo milagroso. Assim, Sodoma e Gomorra não foram destruídas por causa da fúria de Deus, não há vestígios da arca de Noé no monte Ararat, mesmo com a realização de várias expedições arqueológicas patrocinadas por igrejas cristãs desde o século XIX.

Voltaire, filósofo francês e deísta, acreditava que para chegar a Deus não precisava ir à igreja, mas sim a razão, dizendo que ela era o maior presente que a criação poderia nos dar. Talvez a religião tenha sido uma tentativa de explicar a nossa existência e o Universo em uma fase na história da humanidade em que não havia entendimento suficiente, embasado em ciência. Quando não sabem a resposta para algo, baseada na ciência, a humanidade costuma atribuir ao mundo das divindades. Por exemplo, as primeiras civilizações atribuíam a causa dos relâmpagos a fúria dos deuses, por falta de entendimento desse fenômeno natural tão comum.

Nesse artigo será apresentado alguns argumentos que me levaram a questionar as religiões e que, consequentemente, me levou a se tornar um deísta. Saliento que, no momento, sou deísta por falta de explicações balizadas por métodos científicos convincentes e cabais sobre a nossa existência, por isso, Deus está lá. O intuito é levá-lo, leitor, a fazer os mesmos questionamentos. Fique à vontade em buscar, por conta própria, as respostas que acharem mais convenientes e convincentes.


TESE: A POSSIBILIDADE DE OUTRAS CIVILIZAÇÕES

Os astrônomos calcularam que o universo existe há aproximadamente 14 bilhões de anos, e que o nosso sistema solar começou a se formar há pelo menos 4,6 bilhões de anos. Os hominídeos só alcançaram um estágio evolutivo considerável, que lhes dessem aparência e inteligência relativamente próxima ao do homem moderno há apenas 700 mil anos, com o aparecimento do Homo Heidelbergensis. Partindo desse ponto (da longevidade do universo), é difícil acreditar que durante todo esse tempo só exista nossa civilização em todo a vastidão do universo.

OBS: Para efeito de comparação e termos uma breve noção da imensidão do espaço, se reduzisse o nosso Sol (1.392.700 km) ao tamanho de uma ponta de caneta e, na mesma proporção, reduzisse a Via Láctea (105.700 anos-luz), nossa galáxia teria um tamanho equivalente ao território brasileiro. 1 ano-luz = 9,5 trilhões de km.

TALVEZ houve tempo suficiente e condições adequadas para surgimento e evolução de outras civilizações há milhões ou até bilhões de anos antes do aparecimento do Homo Sapiens (200 mil anos atrás) no planeta Terra. Observações espaciais têm mostrado que há vários planetas no universo com condições de desenvolver vida (os exoplanetas potencialmente habitáveis).

Imagine uma civilização muito antiga, com 1 bilhão de anos de existência, qual seria o seu nível tecnológico e de conhecimento acumulado. 1 bilhão de anos atrás a Terra estava na Era Neoproterozoíca, havia apenas um supercontinente primitivo, árido, chamado Rodinia, o dia tinha 18 horas de duração, a vida multicelular só começaria a surgir 400 milhões de anos depois.

O cérebro humano não compreende grandes quantidades, por isso subestimamos o tamanho de 1 bilhão. 1 milhão de segundos = 12 dias; 1 bilhão de segundos = 32 anos e 8 meses.

Em 1961, o astrônomo Frank Drake apresentou uma equação nada ortodoxa, que mostrava a probabilidade de haver vida inteligente em nossa galáxia com as quais poderíamos ter chances de estabelecer comunicação, ficou conhecida como Equação Drake (lembre-se, é uma estimativa, uma vez que seus parâmetros não são exatos).

Drake propôs a seguinte fórmula: N = R x Fp x Ne x Fl x Fi x Fc x L, sendo que:

  • N = número de civilizações na Via Láctea com as quais poderíamos estabelecer contato;

  • R = número estimado de estrelas em nossa galáxia;

  • Fp = fração das estrelas em nossa galáxia que possuem sistemas planetários;

  • Ne = média de planetas por sistema solar, com um ambiente adequado para a vida, mesmo que seja as formas mais simples, como os microrganismos;

  • Fl = fração desses planetas habitáveis em que a vida realmente possa se desenvolver para formas mais complexas;

  • Fi = fração desses planetas (FI) que desenvolveram vida inteligente;

  • Fc = fração de planetas com vida inteligente e que tem o desejo e os meios necessários para estabelecer comunicação;

  • L = tempo médio de existência dessas civilizações em relação a duração do universo. Considerando que a grande maioria das prováveis civilizações que tenham surgido se extinguiram, seja por causas internas (tais como, guerras nucleares, glaciações) ou externas (tais como, colapso da estrela hospedeira, explosão de raios gama próximo ao planeta).

O físico e astrônomo Carl Sagan, no livro “Intelligent Life in the Universe” (1966), fez seu próprio cálculo, usando a fórmula de Drake. Adotando uma visão bastante conservadora, deu os seguintes valores para cada elemento da equação (não cito os fatores considerados por Sagan para chegar a tais números):

  • R = 400 bilhões de estrelas

  • Fp = ¼ (100 bilhões)

  • Ne = 2 (200 bilhões)

  • Fl = ½ (100 bilhões)

  • Fi = 1/10 (10 bilhões)

  • Fc = 1/10 (1 bilhão)

  • L = 0,00000001 (um centésimo de milionésimo)

Sendo assim, o cálculo ficou da seguinte maneira:

N = 1 bilhão × 0,00000001

N = 10 civilizações inteligentes só na Via Láctea com capacidade de se comunicar. Agora, imagine quantas civilizações deve haver nas bilhões de galáxias existentes no universo.

Trata-se de um valor baixo, que coloca os cientistas em posição difícil, afinal, se por um lado há alguém transmitindo informações lá fora, a chance de encontrarmos uma das 9 sociedades alienígenas (sendo a de número 10 a nossa) em meio a 400 bilhões de estrelas é ínfima. O espaço pode está zumbindo com mensagens das estrelas, mas, talvez eles usem tecnologias diferentes das nossas, talvez não tenhamos alcançado um nível tecnológico suficiente para identificar e decifrar tais mensagens (atualmente usa-se radiotelescópio).

Se for comprovado a existência de vida extraterrestre inteligente o cristianismo perderá o seu sentido basilar imediatamente, aquele de que Deus veio à Terra na figura de Jesus. Até é possível que a figura de um criador-mor, incognoscível, possa ser assimilada por outras civilizações extremamente diferente de nós, mas, não as religiões terrenas, com seus dogmas, crenças, messias e profetas baseados em características e aspectos essencialmente humano, desenvolvida em volta do estilo de vida humano.

Os pesquisadores formulam teorias, desenvolvem complexos cálculos matemáticos, fazem inferências, aplicam métodos científicos, desenvolvem tecnologias para a pesquisa, na exaustiva tentativa de compreender o universo. Muitas perguntas são respondidas, outras parecem que permanecerão incognoscíveis, estando além da nossa capacidade de compreensão e raciocínio. Veja alguns exemplos disso: Como Deus surgiu e o que havia antes dele? Pode algo sempre existir, sem ter uma origem, um começo?

Usando projeções conservadoras para projetar uma estimativa da quantidade de estrelas no Universo, vamos multiplicar 100 bilhões de galáxias por 10 bilhões de estrelas por galáxias (1011 x 1010). O resultado é impressionante, 1 bilhão de trilhões de estrelas (1021), um valor imensurável. Lembre-se, é uma estimativa bastante baixa, uma vez que as projeções mais adequadas estimam para uma galáxia do tamanho da Via Láctea (o padrão mais comum) uma população estelar entre 100-400 bilhões de estrelas.

Os geógrafos calculam que hajam aproximadamente 320 mil km de costas litorâneas e 15 milhões de km² de desertos na superfície do nosso planeta. Com esses dados e considerando a quantidade aproximada de grãos de areia por m³, estima-se que haja cerca de 7 bilhões de milhões de grãos de areia no planeta. Esse resultado é apenas uma fração do total do número de estrelas no Universo observável. Vivemos em um planeta que faz parte de um Cosmo inimaginavelmente grande e complexo. Não é possível haver apenas nós, como civilização.

Olhemos para nós, como espécie inserida nesse espaço infinito e na possibilidade de haver várias outras civilizações inteligentes no Universo, com grande possibilidade de boa parte delas serem bem mais avançadas, e indagamos: O que poderia haver nos humanos de tão relevante que os fizessem tão especiais para merecerem a atenção do criador-mor, em detrimento de outras raças? Somos limitados, defeituosos, gananciosos, intolerantes e problemáticos. O homem é tão egoísta que é preciso falar de uma recompensa em outra vida para que ele tente praticar o bem nesta existência.


TESE: HÁ CÉU E INFERNO?

Não acredito que haja céu e inferno, mas quero acreditar que há vida eterna após a morte. Talvez o “paraíso” seja aquilo que a mente de cada um tenha idealizado como lugar perfeito para se viver eternamente. A minha idealização de “paraíso”, por exemplo, é fazer uma viagem pelo espaço-tempo e presenciar tudo que aconteceu no cosmos, o momento do big-bang e o que havia antes dele, a evolução do universo e seus grandes fenômenos, depois, vagando com meu espírito fantasmagórico, acompanhar cada etapa da formação do nosso sistema solar, ver a grande colisão da Terra com Theia, a evolução do nosso planeta e a origem da vida, o surgimento e evolução humana e das civilizações, aprender todos os seus segredos, tudo aquilo que ficou oculto nos registros históricos.

Segundo as doutrinas religiosas, aquele que não segue seus ensinamentos serão condenados para o sofrimento eterno, não alcançando o tão almejado galardão celestial. Mas, em relação àquelas pessoas que não conhecem tais doutrinas, logo, não sendo praticantes, serão condenadas mesmo sendo inocentes? Ou receberão um indulto, uma anistia de Deus? Se há um “paraíso” post mortem, porque não nascemos diretamente nele, sem passar por essa fase terrena, em que somos mortais, frágeis, sujeitos às emoções negativas? Assim simplificaria bastante as coisas, não geraria pecadores nem crise depressiva.

O que há depois da morte? Não sabemos, o que passar disso são apenas especulações, pois não há comprovação empírica. Mesmo assim, quero acreditar que há alguma coisa importante no “além” que justifique nossa extraordinária racionalidade e consciência adquirida ao longo do processo evolutivo, caso contrário, seria um desperdício colossal e uma solidão sem precedente, existir para nada.

No universo quase tudo que morre não se torna em nada, mas, transforma-se em algo novo. A morte de uma estrela resultará em uma anã branca, estrela de nêutron ou buraco negro, a matéria remanescente após sua supernova dará origem a novas estrelas e planetas em sua nebulosa. Nós, assim como tudo que há no planeta Terra, somos formados por elementos químicos, e estes, surgem na nucleossíntese estelar. Somos filhos das estrelas.

A ciência tem avançado de forma rápida, no início da década de 2020, já estão sendo desenvolvidas soluções para doenças atualmente incuráveis. Por exemplo, a vacina contra o mal de Alzheimer já está em estágio final, sendo testada em humanos; cientistas descobriram um composto que reverte a degeneração dos neurônios motores superiores, a principal causa da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA); pesquisadores espanhóis estão desenvolvendo uma nova técnica que permitirá que cegos voltem a enxergarem, através de estímulos elétricos no córtex occipital.

Com a evolução da tecnologia e da ciência genética, em poucos anos veremos o florescer do chamado transhumanismo, ou seja, a transformação da condição humana através do desenvolvimento de tecnologias capazes de aprimorar o intelecto e a fisiologia humana e, quem sabe, em uma fase mais longínqua, até mesmo a capacidade de ressurreição. Inclusive, alguns milionários já contratam empresas especializadas nos Estados Unidos e na Rússia para manterem seus corpos em criogenia (criônica) após a morte, pensando na futura capacidade da ciência de reanimá-los e trazê-los para a vida. Quando isso for possível, qual será o sentido dos conceitos religiosos sobre vida após a morte, tais como a promessa do céu ou o medo do inferno? Já que o ser humano terá a capacidade de ir e voltar quando quiser.


TESE: É O PODER DA NOSSA MENTE E NÃO UM MILAGRE

A nossa mente tem um poder que é desconhecido pela maioria das pessoas. Temos o livre arbítrio de tornar os nossos pensamentos em materialidade na nossa própria realidade, mas geralmente, não nos damos conta de que foi nós e não algo externo, que determinou o resultado. As observações e interações com “espíritos” não passam de projeções de medo, trauma (por exemplo, a não aceitação da perda de um ente próximo) ou outros fenômenos psíquicos, como paralisia do sono.

Se através da parapsicologia, hipnoterapia, mentalismo, entre outros meios, consegue-se convergir a mente humana a eventos no mundo material, como precognições, controle psíquico, acesso as memórias esquecidas através de regressão, controle do sistema nervoso para mitigação de dor, se nosso cérebro consegue identificar características da personalidade de outras pessoas, seja por meio dos feromônios ou pelos campos elétricos extracelulares existentes no cérebro, como os do hipocampo e neocórtex, que se irradiam em nossa volta (o famoso “senti uma energia negativa”), significa que, as profecias, revelações e prodígios não são elementos exclusivos das liturgias religiosas, pois se consegue praticá-los fora do ambiente religioso.

Em 1924, o psiquiatra e neurologista alemão Hans Berger, obteve o primeiro traçado eletrencefalográfico humano. Utilizando eletrodos introduzidos sob o couro cabeludo e um eletrocardiógrafo, Berger descobriu nas áreas occipitais as oscilações de potencial que denominou de “ondas alfa”. Ele estudou durante vários anos o eletrencefalograma humano, publicando seus trabalhos ao longo da década de 1930. As informações viajam dentro dos neurônios por meio de eletricidade, comunicando-se por sinapses elétricas ou químicas, produzindo um campo elétrico, em algumas regiões mais forte do que outras, como ocorre no hipocampo (onde ocorre a formação da memória) e neocórtex. 

As ondas cerebrais estão ligadas diretamente aos sentimentos, estados emocionais, distúrbios psicológicos e estados meditativos. O cérebro pode trabalhar em alta frequência, talvez os quase 100 bilhões de neurônios e 100 trilhões de conexões podem produzirem um campo elétrico em nossa volta, podendo ser detectados pelos receptores nervosos de alguém próximo. Pense nesse campo elétrico produzido pelo cérebro, seria os nossos pensamentos, desejos e memórias pairando pelo ar. Pode ser daí a origem da capacidade de nossa mente interagir com o meio ambiente externo, aquele momento de algo nos dizendo sobre aquele lugar ou sujeito antes mesmo de conhecê-lo, ou aquela conexão com um parente próximo. A ligação emocional que o filho tem com sua mãe pode ser algo semelhante a um entrelaçamento quântico? Não sabemos, vamos a ver.

O computador mais potente do mundo é o Sunway TaihuLight, uma máquina em operação desde 2016. Sua velocidade máxima é de 125 quatrilhões de cálculos por segundo. O problema desse supercomputador é o consumo de energia para operar: 15,3 MW. Enquanto o Sunway TaihuLight precisa de uma pequena hidrelétrica para funcionar, o nosso cérebro lê este texto e executa tarefas tão complexas quanto, claro, um pouco mais lento, usando apenas 10 a 20 watts – menos do que uma lâmpada.

Ademais, por achar que há uma ligação com o espiritual que muitos ficam se indagando o porquê determinada pessoa de tão bom caráter morreu de forma trágica e prematura, enquanto outras, que causa tanto dano a sociedade, parece nunca chegar o castigo divino. Os tais livramentos ou castigos nada mais são do que a consequência de uma cadeia de eventos pretéritos regidos pelas leis naturais ou pela probabilidade, como um acidente de avião, que acontece como resultado de uma sequência de erros, se a cadeia de erros é quebrada, um dos elos é desfeito, o acidente não acontece.

O filósofo Baruch Spinoza, também um deísta, considerava os eventos milagrosos das maiores tradições religiosas como superstições organizadas. Para ele o pensamento mítico representava um perigo para o futuro dos cidadãos de uma sociedade que pretendia ser racional e livre. Ele escreveu em seu livro “Tractatus Theologico-Politicus” (1670): Não procure por Deus nos milagres, eles são violações das leis da natureza, Deus é melhor compreendido nos estudos dessas leis.

A explicação para a maioria das supostas curas é o efeito placebo, uma técnica bastante usada na medicina – a capacidade do cérebro de acreditar em algo curativo e se curar sozinho, usando pilulas de farinha. É utilizado em terapias ou procedimentos inertes que apresenta efeitos terapêuticos devido ao psíquico, ou seja, da crença do paciente de que ele está sendo tratado, ocasionando uma sensação de bem-estar.

As orações, rituais e objetos “sagrados”, como os amuletos, são as pilulas de farinha das religiões, atuando como estimulantes cerebrais na mente de seus fiéis. As emoções dos cultos são potencializadas pela música, pelas liturgias praticadas e a atmosfera dentro dos templos, e isso exerce uma influência e estímulo extraordinário no psíquico humano, acentua as emoções, no processo de hipnose é semelhante ao pre-talk.

O médico alemão Franz Anton Mesmer (1734-1815), interessado em entender os processos de cura das doenças humanas, principalmente aquelas de ordem emocional, como a melancolia e a depressão, começou, em 1774, a praticar um antigo conceito grego de que os ímãs poderiam interferir no corpo humano, atraindo ou repelindo doenças pelo magnetismo.

Assim, começou a aplicar ímãs em seus pacientes, observando que esse processo gerava convulsões e, consequentemente, a tão almejada cura. Ele chegou a conclusão de que havia um fluido magnético que animava o corpo e era responsável pela condição de saúde ou doença, denominando-o de “magnetismo animal”, sendo função do curador canalizar esse fluído universal para dentro do corpo do paciente a fim de gerar equilíbrio. Com a evolução de sua técnica, Mesmer concluiu que os ímãs eram dispensáveis, podendo ele mesmo canalizar tal fluido universal e orientá-lo no corpo das pessoas por meio de gestos ou imposição de mãos.

Quando em 1778 partiu de Viena para Paris, sua fama de curador místico já era grande. A fama lhe rendeu alguns inimigos, principalmente da classe médica e científica. Para muitos, o que Mesmer fazia não passava de charlatanismo, levando o rei Luís XVI a criar um comitê para investigar o famoso “magnetismo animal” e como funcionavam tais práticas, tendo, inclusive, Benjamim Franklin como um dos membros.

Rapidamente perce-beram que as famosas crises mesméricas, como convulsões, tremores, transe ou desmaios eram provocados independentemente de um mesmerista, pela simples crença ou expectativa do paciente. Quando diziam ao voluntário que um mesmerista estava na sala (o que era mentira), prontamente as crises mesméricas começavam. Por outro lado, mesmo na presença de um mesmerista competente, porém, sem avisar o paciente voluntário, nenhum fenômeno ocorria. Embora Mesmer realizasse curas, não sabia ele que tudo era apenas fruto da fé e expectativa de seus pacientes.

Um outro exemplo mais recente e próximo de nós, é a figura do médium João de Deus, líder da Casa Dom Inácio de Loyola. As pessoas que o procurava precisavam está mentalmente receptivas aos seus métodos de curandeirismo, uma questão de atitude metal, a pessoa precisava querer passar pela experiência e, acima de tudo, permitir que aquilo acontecesse. E isso era reforçado pela equipe de funcionários da Casa, que endossava aquela crença. Essa aceitação somada com a vulnerabilidade do estado psicológico (emocional) do paciente e a atmosfera do ambiente, tornava-se em condição ideal para o pre-talk (a fase pré-hipnótica).

Na Casa Dom Inácio eram vendidos um “medicamento”, cujos ingredientes apenas alguns funcionários da Casa conhecia (alegadamente a base de passiflora), o produto era receitado para todos, independentemente dos problemas, sintomas, e sem prévia consulta. As pessoas eram orientadas a, quando fossem utilizar o medicamento, mentalizar qual o problema ele curaria, qual era a sua maior finalidade. Assim, uma “energia de cura” seria liberada.


TESE: A NOSSA CONEXÃO COM O MUNDO ESPIRITUAL

Sabemos por meio da astrofísica que somos produto intrínseco do universo, resultado de um processo chamado de Nucleossíntese estelar, em que os elementos químicos são criados no interior das estrelas e espalhados pelo espaço através das supernovas que, por sua vez, dar origem as nuvens moleculares (nebulosas), de onde, posteriormente, surgem novas estrelas e novos planetas. Somos o conjunto de átomos de bilhões de anos, em outras palavras, somos o universo expressado na forma humana.

É intricante, mas parece que todos os seres viventes carregam um “código do criador”. Você pode ir a qualquer lugar no planeta, seja em uma tribo remota situada na Polinésia, seja no meio da Amazônia ou no deserto do Niger, pode até retroceder na história, aos povos primitivos do período neolítico, verás que sempre houve essa busca constante por Deus, a curiosidade em querer desvendar seus mistérios. Há algo que impuciona, atrai o ser humano, de forma instintiva e natural, para essa ligação com o espiritual. A resposta poderia está dentro de nós?

Apenas 14% do DNA humano contém os genes responsáveis por carregar as instruções que ensinam nosso corpo a produzir as proteínas necessárias para o funcionamento do organismo, é o que os cientistas chamam de “codificador”. Os 86% restantes ainda não foi decifrado, por isso, costumam chamá-lo de DNA lixo. Em um futuro próximo, a ciência conseguirá decifrá-lo, e talvez, o elo perdido com Deus seja descoberto, ou não.

Em 2004 o geneticista Dean Hamer, em seu livro “The God Gene: How Faith is Hardwired into our Genes”, propôs uma ideia revolucionária, a hipótese da “gene de Deus”. De acordo com o geneticista, a espiritualidade tem ligação com um componente genético chamado de VMAT2 (vesicular monoamine transporter 2), que torna o ser humano predisposto a ter experiências sensoriais, contribuindo para sensações associadas a experiências místicas e sentimentos de conexão com um universo maior. Claro que novos estudos precisam ser realizados para aprofundar o conhecimento, e também, descobrir quais os fatores que estimularam o desenvolvimento desse gene no processo evolutivo humano.

Os antigos filósofos gregos se impressionavam com a ordem que permeia o cosmo, e muitos deles, em especial da academia de Platão, atribuíam à obra de uma mente inteligente que formou o universo. Nos últimos tempos, a comunidade científica vem se espantando com descobertas de como é complexo e sensível o elo de condições iniciais para que o universo permita a origem e evolução de vida inteligente.

A descoberta do ajuste fino cósmico para vida inteligente levou muitos cientistas a concluir que tal equilíbrio tão delicado de constantes e quantidades físicas exigido para a existência de vida não pode ser uma mera coincidência, parece manifestar a presença de uma inteligência arquitetural. O Universo não foi criado para seres como nós, ele é muito hostil para o desenvolvimento da vida, parece que tudo foi planejado e não tenha acontecido aleatoriamente pelo acaso.


TESE: A ORIGEM DAS RELIGIÕES

O intuito desse artigo não é convencer, mas unicamente de expor um raciocínio e levá-los ao questionamento. Para assumir uma nova crença, é necessário estar pronto para quebrar os laços mais enraizados da personalidade, quebrar os paradigmas, sempre tomando cuidado para não se perder no meio desse caminho de descobertas, que vale salientar, deve acontecer paulatinamente de modo que esses comportamentos pouco frequentes, prescritos pelo novo conhecimento, vão aos poucos se tornando habituais, caso contrário, haverá uma completa confusão em sua mente, um desequilíbrio.

Por exemplo, nem todos estão preparados para, repentinamente, negar a divindade de Jesus, isso esbarra, dentro do conceito de arquitetura do pensamento social proposto pelo psicólogo Jean-Claude Abric, no núcleo central ou estruturante do psíquico, onde situa os elementos mais cristalizados, resistente a mudanças, tais como, ideologias e crenças, em contraponto ao chamado núcleo periférico, mais instável, que permite a adaptação à realidade com mais facilidade, onde situa as opiniões e comportamentos sociais.

Como surgiu a religião? Provavelmente o aspecto religioso tenha surgido no período que os antropólogos denominam de “explosão criativa do paleolítico superior”, ocorrido em torno de 60 mil a 40 mil anos atrás, período em que se desenvolveu a linguagem, os rituais, prática de enterros, as artes simbólicas, como as pinturas rupestres, petróglifos, estatuetas e adornos corporais. É nesse período que o homo sapiens começou a desenvolver de forma mais acentuada, características comportamentais semelhantes ao homem moderno.

Segundo teoriza o psicólogo evolucionário Robin Dunbar, nos primórdios as religiões não tinham deuses nem códigos morais, era mais uma experiência, que envolvia êxtase, estado de transe ou uma maneira de dar significado para as coisas incompreensíveis.

Jonathan Turner, Alexandra Maryanski, Anders Petersen e Armim Geertz, no livro “The Emergence and Evolution of Religion” (2017), relatam que esse processo se inicia bem antes, com o desenvolvimento de nosso cérebro, há pelo menos 4,5 milhões de anos, com os Homo Australopithecus. Eles dizem que as alterações mais importantes têm a ver com as partes subcorticais do cérebro, o que deu aos hominídeos a capacidade de sentir um leque mais amplo de emoções. Essas emoções adicionais promoveram uma conquista crucial para o desenvolvimento da religião.

Existe as chamadas quatro emoções básicas ou primárias, que são: raiva, medo, tristeza e felicidade. Eles introduzem o conceito de elaborações de primeira e segunda ordem, que são emoções que resultam de combinações de duas ou mais emoções primárias. Por exemplo, culpa e vergonha, duas emoções cruciais para o desenvolvimento da religião, é a combinação de tristeza, medo e raiva. A reverência, também muito presente na religião, é a combinação de medo e felicidade.

Para os autores, é difícil imaginar a religião sem a capacidade de experienciar essas elaborações emocionais pelo mesmo motivo que é difícil imaginar grupos sociais sem elas: essa paleta emocional nos une num nível visceral. E uma vez que essas novas valências de emoções positivas são neurologicamente possíveis de ser geradas, elas podem se tornar interligadas com rituais ou outros comportamentos que produzem ou estimulam tais emoções.

Segundo o primato-logista Frans de Waal, todas as sociedades têm algum tipo de religião, não há exceção. Para Waal, há algumas perspectivas sobre o motivo disso. Uma é chamada de funcionalismo ou adaptacionismo: a ideia de que a religião tem benefícios evolucionários positivos, mais frequentemente definidos em termos de sua contribuição para a vida em grupo. A ideia que, se todas as sociedades têm religião, deve ter um propósito social.

A partir do momento que as religiões passaram a ser institucionalizadas, tornaram-se ferramentas de adestramento social, da manutenção da coesão social. Um bom exemplo é o processo de catequização dos povos nativos do novo mundo por parte dos missionários jesuítas. Há época, tal processo ajudava na subjugação e a evitar conflitos prolongados.


TESE: A DIVINDADE DE CRISTO NÃO EXISTE

O escritor britânico Fitzroy Raglan em seu livro “The Hero: A study in tradition, myth and drama” (1975), identifica vários padrões comuns em figuras heroicas dos mitos e lendas, tais como, ter uma mãe virgem da realeza; ser filho de rei ou algum deus; as circunstâncias de sua concepção ser incomum; ao crescer regressa ou vai para o seu futuro reino; promulga leis de grande impacto social; tem uma morte misteriosa, em geral no topo de um monte; etc. Isso é visto em Hércules (grego), Thor (nórdico) e Indra (hindu). São parâmetros interessantes, que instiga à comparação dos padrões mitológicos de Jesus com outros personagens religiosos que o antecedeu, identificando suas profundas semelhanças. Vejamos:

BUDISMO

Como o budismo poderia ter exercido influência na Palestina, a mais de 4 mil km de distância? O imperador Ashoka, O grande, unificador do subcontinente indiano, cujo reinado se deu entre 268-232 BCE, promoveu a difusão do budismo, enviando emissários para a Ásia Central e Oriente Médio, a fim de propagar suas doutrinas religiosas.

  • Buda, visitou o templo aos 12 anos de idade, à semelhança de Jesus. Supostamente, também jejuou na solidão, por 47 dias, Jesus jejuou por 40 dias no deserto. Ambos tinham quase a mesma idade quando começaram seus ministérios de fé. Jesus na Palestina, no auge do império Romano, e Buda na região que hoje compreende o Nepal, isso cinco séculos antes do nascimento de Jesus.

  • Outro ponto em comum bastante interessante é o local de meditação e ascensão de ambos os personagens, Buda frequentava um bosque e sentava embaixo de uma figueira para fazer suas meditações, a Árvore de Bodhi (situada em Bodh Gaya, Índia). E foi sob essa árvore que ele alcançou a iluminação espiritual. Jesus fazia rotineiramente suas orações no Getsêmani, um campo de oliveiras situado nas redondezas da cidade de Jerusalém. No livro de Atos dos Apóstolos, afirma que a ascensão espiritual de Jesus ocorreu no monte das Oliveiras.

  • Segundo a tradição budista, Buda foi concebido em uma noite em que sua mãe, chamada Maya, recebeu uma visita espiritual de um ser em forma de elefante branco. Na tradição cristã, Maria concebeu Jesus depois da visita do arcanjo Gabriel.

ZOROASTRISMO

Mais antigo ainda é a história de Zaratustra, um profeta nascido na região da Pérsia. Não existe um consenso em torno do período em que viveu, os acadêmicos têm situado a sua vida entre 1.500-1.200 BCE. Ele fundou o Zoroastrismo, a primeira religião monoteísta da história da humanidade, que tinha como doutrinas a crença no paraíso, na ressurreição, no juízo final e na vinda do messias. Bastante praticada na região, acabou se tornando a religião oficial do Império Aquemênida (550 – 330 BCE).

  • Nos relatos tradicionais, conta que ele nasceu de uma mãe virgem, de acordo com Gathas, o sacerdócio provavelmente começou muito cedo, entre os 7 a 15 anos de idade, ganhando respeito dos velhos professores, assim como Jesus, que em sua juventude teria surpreendido muitos anciões com a sua sabedoria.

  • Aos 30 anos começou seu ministério, e foi nessa idade que ocorreu o seu batismo. Segundo a tradição, enquanto participava de um ritual de purificação em um rio, Zaratustra viu um ser de luz que se apresentou como sendo Vohu Manah. No batismo de Jesus, também aos 30 anos, apareceu um ser em forma de luz. Até no número de parentes Zaratustra e Jesus se assemelham. Zaratustra tinha 4 irmãos homens, cujos nomes são dados na literatura Pahlavi. Segundo o capítulo 3 do Evangelho de Mateus, Jesus também teve 4 irmãos homens.

  • Durante o seu ministério, Zaratustra foi capaz de expulsar demônios e devolver a visão para um cego, ganhando muita notoriedade na região. As autoridades civis e religiosas opunham-se às suas doutrinas. Os saduceus e fariseus na Palestina, se oponham às doutrinas de Jesus. Após a morte de Zaratustra, seus seguidores esperavam por sua volta a Terra.

HINDUÍSMO

O hindu é mais uma religião que surgiu em um período pretérito ao nascimento do cristianismo. Acredita-se que tenha surgido após o período védico na Índia, entre 500-200 BCE, quando as epopeias e os primeiros puranas foram compostos.

  • O hinduísmo devota uma pessoa conhecida como Krishna, que acredita que foi a manifestação do deus Vishnu. Os seguidores de Krishna o reconhecia como divino, lembrando a figura de Jesus no cristianismo, que é considerado pelos seus seguidores como o Deus encarnado.

  • A semelhança continua quando Kamsa, tio de Krishna, planejava matá-lo por medo de perder o trono. Vasudeva, pai de Krishna, o escondeu, junto com seus irmãos, para que não fossem mortos. Esse episódio lembra a história de Herodes procurando Jesus para matá-lo quando ainda era recém nascido, com medo de haver revolução popular de apoio e posterior perda do trono.

  • Krishna morre ferido por uma flecha, quando um caçador chamado Jara o atinge por engano. Krishna o perdoa e logo em seguida morre. Só que ele retorna a vida tempo depois, de forma transcendente, lembrando a ascensão de Jesus, após perdoar o ladrão no Gólgota antes de morrer na cruz, ressuscitando após 3 dias.

GRÉCIA ANTIGA

  • O deus grego Dionísio, assim como Jesus, morreu e ressuscitou de forma bastante folclórica. Outro paralelo pode ser visto quando Dionísio aparece diante do rei Pentheus sob a acusação de reivindicar a divindade, o que é comparado à cena de Jesus sendo interrogado por Pôncio Pilatos. Outros elementos, como a celebração de uma refeição ritualística de pão e vinho, também têm paralelos. A omofagia foi o ato dionisíaco de comer carne crua e beber vinho para “consumir” o deus, bastante semelhante com a concepção da ceia cristã.

  • O pai de Dionísio era um deus que se envolveu em uma relação sexual com uma mulher mortal, ocasionando o nascimento de um filho semideus. O mesmo padrão se aplica ao nascimento de Jesus, cuja mãe, a virgem Maria, recebeu a visita do arcanjo Gabriel.

A comparação se estende até personagens históricos não religiosos. Há comparação do momento que antecede a prisão de Jesus com os últimos momentos de Sócrates, narrado em um dos grandes diálogos de Platão, intitulado Fédon. Neste diálogo se extrai o seguinte:

  • Sócrates foi preso e condenado à morte por um júri ateniense por não acreditar nos deuses do Estado e de supostamente corromper a juventude da cidade. Semelhante a história de Jesus, em que ele teria sido torturado, contudo, não abriu a sua boca, agiu como um cordeiro levado ao matadouro. Um dos trechos do diálogo narra o momento final de Sócrates:

Depois de assim falar, levou a taça aos lábios e com toda a naturalidade, sem vacilar um nada, bebeu até à última gota. Até esse momento quase todos tínhamos conseguido reter as lágrimas, porém, quando o vimos beber, ninguém mais aguentou (…).

  • Sentenciado a beber cicuta, um veneno fatal usado em condenados a morte em Atenas, Sócrates passou seus últimos momentos junto com seus discípulos, Críton, Fédon, Apolidoro, Cebes e Símias. Quando o seu corpo desfalecia, ironicamente recordou-se que devia sacrificar um galo a Esculápio, o deus da medicina. Antes da prisão e crucificação, Jesus fez sua derradeira ceia com seus apóstolos, e igualmente lembrou-se de um galo, prevendo que Pedro o negariaantes que o galo cantasse”.

  • A estória da criação de Adão e Eva, narrada no livro bíblico de Génesis, é uma adaptação dos mitos de Prometeu e de Pandora, escritos pelo poeta grego Hesíodo no fim do século VIII BCE (muito anteriores aos manuscritos do Mar Morto, considerados as cópias mais antigas existentes dos livros da bíblia hebraica, datados entre 250–100 BCE). Vejamos um pequeno trecho do mito de Prometeu:

Céu e terra estavam criados. (…) Mas não havia nenhuma criatura onde o espírito pudesse alojar-se (…). Prometeu, então, chegou a terra. Ele descendia de deuses que tinham sido derrotados por Zeus (…), sabia que, no seio da terra, dormia a semente dos céus. Por isso, apanhou argila, molhou-a em um rio, amassou-a e formou uma imagem à semelhança dos deuses. (…) Atenas, deusa da sabedoria, admirou a obra e insuflou naquela imagem o sopro divino.

...

Como a história de Jesus pode ser verídica se ela já foi narrada por várias vezes bem antes de seu provável nascimento? Cada religião é influenciada por outras que a antecederam, sofrendo adaptações pela cultura local. Eu comparei o cristianismo com o período pretérito, mas, pode-se comparar, por exemplo, com o islamismo que surgiu posteriormente e valeu-se de inúmeros elementos do cristianismo na sua formulação, e assim por diante, religiões influenciando outras.

Na bíblia está escrito que fomos comprados pelo sacrifício de Jesus na cruz. Quem nos vendeu? Como um Deus cria algo e precisa fazer um sacrifício para comprar sua criação? Na bíblia também está escrito que Moisés viu Deus, o apóstolo Paulo disse que ninguém viu Deus. No deserto, satanás seduziu Jesus dizendo: “está vendo tudo isso? É tudo meu, foi dado a mim (…)”. Deus cria tudo, e pega esse tudo, que lhe pertence, e dar para o seu adversário? Em vários versículos a bíblia fala que Deus é um Ser de luz, também fala, no livro de Salmos, sobre a sobra do onipotente. Luz tem sombra? Se você pegar uma vela acesa e colocá-la perto da parede, verás apenas a sombra da vela.

Jesus, no máximo, foi um mero pregador que buscava renovar o judaísmo, conseguindo arregimentar muitos seguidores, assim como ocorreu com Martinho Lutero, que desencadeou a reforma protestante no início do século XVI. Tendo bastante adesão popular na região da Ásia Menor e toda a bacia do Mediterrâneo, as lideranças políticas entenderam ser benéfico usar essa nova crença como a religião do Estado, primeiro ocorrendo no Reino da Armênia em 301 CE, depois os Romanos, com Constantino I realizando o primeiro Concílio de Niceia (325 CE), veio o Édito de Tessalônica (380 CE), que foi incorporado ao Código Teodósio. A elevação da figura de Jesus ao patamar de divindade ocorreu oficialmente apenas no primeiro Concílio de Constantinopla, em 381 CE.


CONCLUSÕES

Durante alguns anos pensei que minha fé era fraca e que eu não era um bom cristão, precisava orar e ler mais a bíblia. Havia muitas coisas que desafiavam a razão, e o pior, muitas coisas que retratavam Deus como etnocêntrico, ambíguo, emocional e duvidoso. Isso é uma característica mais humana do que divina. As pessoas não precisam viver sob a ameaça da condenação ao inferno só porque acreditam em coisas que desafiam a lógica. A ameaça da condenação e a promessa da vida eterna não são comprovadas e não têm fundamento epistemológico.

A bíblia impõe uma trava de segurança a ousadia dos pensamentos. Essa proibição é imposta desde o início da bíblia, quando na história de Eva e Adão no Jardim do Éden, Deus proíbe os dois moradores de comerem do fruto da árvore do conhecimento, cujo descumprimento acarretaria em morte. No Evangelho de Lucas capítulo 12 e no Evangelho Marcos capítulo 3 diz que todos os pecados são perdoáveis, exceto um, negar a divindade, se fizer isso, estará condenado eternamente. Se alguém ousar questionar a falta de evidências cometerá o maior crime no fundamentalismo cristão, que é pensar de forma livre.

Religiões são áreas nas quais tolera-se dogmas sem critica. Negar que o Holocausto existiu ou declarar que conversa rotineiramente com o ET Bilú, são tomados como sinônimos de loucura. É assim porque desafiamos pessoas que acreditam fortemente em algo sem evidências ou com contradições muito fortes, exceto, em temas de fé.

O filósofo Immanuel Kant disse que o intelecto humano pode e deve ser medido pela sua capacidade de colecionar incertezas (não colecionar certezas). Porque o intelecto humano sadio ele não deve dar-se por sabido aquilo que ele ainda precisa descobrir. Mas o que as religiões fizeram, via teologia? Inundaram o ser humano de certezas que não são reais. O ser humano, de tanto escutar essas doutrinas a cada século, passando de gerações para gerações, essas certezas geram, com a mesmice, uma produção paupérrima de conexões neurais, passando milênios sendo o mesmo tipo de ser humano, apequenados.

A conclusão que se chega com essa breve análise é que, pode até haver evidências de um princípio criador, a crença em um Deus segue razoavelmente de observações da ordem natural quase perfeita do cosmo, onde tudo parece funcionar como uma engrenagem (claro, até haver uma descoberta científica concreta). Ao mesmo tempo que há elementos suficientes comprovando que as religiões são meras obras humanas, sem nenhum aspecto de divindade.

Os defensores da existência de uma inteligência criadora dizem que os sinais estão presentes nos detalhes, na precisão do Universo. Por exemplo, se as forças fundamentais da natureza (gravidade, eletromagnetismo, nuclear fraca e nuclear forte) fossem um pouco maiores ou um pouco menores do que são, o Universo entraria em colapso e a vida não existiria. Essas forças estão precisamente na intensidade certa. São muitas variáveis que estão em perfeito equilíbrio que dificilmente seria apenas pelo acaso ou um fenômeno aleatório.

Assim como ocorreu com os humanos primitivos, atualmente levamos para o lado do aspecto da divindade por falta de uma resposta científica que consiga sanar perguntas como; quem criou a singularidade inicial (big-bang)? Qual a explicação da tamanha precisão do universo ou das leis naturais (por exemplo, a lei natural que define que a órbita de um planeta em torno de sua Estrela será sempre elíptica – primeira Lei de Kepler –, não importa em qual lugar do universo esteja)?

Winston Churchill, em sua juventude, certa vez escreveu em uma carta para um amigo:

(…) a cintilante luz fria da ciência e da razão brilhará através das janelas das catedrais e enfim sairemos aos campos para procurar Deus por nós próprios, e as grandes leis da natureza serão compreendidas (…).

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